Descrição para cegos: foto mostra um cartaz escrito: “mexeu com uma, mexeu com todas |
Por Mikaella Pedrosa
"Duzentos mil réis a dois contos de
réis": esse é o preço que se paga no Brasil por importunar alguém de modo
ofensivo ao pudor. A pena está descrita no artigo 61 da Lei das Contravenções Penais de outubro de 1941. Esta foi a decisão do juiz José
Eugenio do Amaral Souza Neto para um homem que ejaculou em
uma passageira dentro de um ônibus, em agosto (29), em São Paulo. Diego
Ferreira Novais, 27, foi solto após 24h.
O texto da decisão divulgado durante a
audiência de custódia, afirma que o crime não se tratou de estupro pois
"não houve constrangimento tampouco violência ou grave ameaça" à
vítima. De acordo com o Estadão,
Diego teve 14 passagens pela polícia, cinco por crimes semelhantes, mas nunca
foi julgado.
A decisão tem sido contestada por juristas e
grupos sociais, com o argumento de que o crime foi mal interpretado e que o
homem deveria ter sido preso por tentativa de estupro.
Para a advogada da Rede Feminista de Juristas
Marina Ganzarolli, o que aconteceu foi estupro: "Se uma das pessoas
envolvidas nesse ato sexual não consentiu com ele, logo, houve constrangimento
e violência. Já enquadra estupro", explicou em entrevista ao G1.
Os crimes contra a liberdade sexual, dentre
eles o estupro, está descrito no Código Penal de 1940, mas teve a redação
atualizada pela Lei 12.015 de 2009. Desde então, o crime tem sido interpretado
como: "Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção
carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato
libidinoso".
Então, se não é estupro e não é contravenção
penal, onde se enquadra o ato de ejacular em uma mulher, agravado por ser em espaço
público, sem sua permissão?
Trata-se do crime de violência sexual
mediante fraude, segundo o advogado especializado em Direito Penal, Ariston Lucas
Ferreira. “Mas é preciso dizer que o erro não foi só do juiz. Também erraram o
delegado e o representante do Ministério Público que apenas enxergaram a
possibilidade de enquadramento do ato tanto em estupro ou na contravenção
penal. Pra mim, trata-se de um clássico resultado da conjunção entre agentes
públicos que não estão preparados para lidar com atos de violência contra a
mulher em uma sociedade machista como a nossa”, explicou.
A redação dessa tipificação de crime prevê
pena em casos de fraude, mas também em outra conduta: “ter conjunção carnal ou
praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade
da vítima”.
A advogada Guadalupe Sampaio explica neste artigo que no fim das contas tudo
se tratou de um erro do delegado, do juiz e do promotor de justiça colocando, desta
forma, outras mulheres em risco ao liberar o indiciado quando, claramente, ele
oferece risco à sociedade.
Entenda o caso
O caso ocorreu no início da tarde de
terça-feira, 29 de agosto, na altura da Alameda Joaquim Eugênio de Lima, na
capital paulista. Um homem se masturbou e ejaculou no pescoço de uma passageira
do ônibus, que dormia.
Assim que percebeu o que estava acontecendo,
a vítima se desesperou e começou a chorar e foi acolhida por outras mulheres. A
Polícia Militar foi acionada e assediador foi mantido dentro do ônibus até ser
retirado pelos policiais. O local rapidamente reuniu dezenas de pessoas.
Revoltados, muitos gritavam, xingavam e ameaçavam linchar o agressor.
O homem foi preso em flagrante e levado ao
78º Distrito Policial, no Jardins. Depois, encaminhado para carceragem do 2°
DP, no Bom Retiro. Foi identificado que ele havia passado cinco vezes pela
polícia por suspeita de estupro, sem nunca ter ido a julgamento.
Durante a audiência de custódia, o delegado
não pediu ao juiz que o mantivesse preso e o promotor de justiça pediu o
relaxamento do flagrante – que acontece quando se considera que a pessoa foi
presa de maneira ilegal.
Detido novamente
Na manhã deste sábado (2), Diego Ferreira de
Novais foi detido pela Polícia Militar ao atacar outra passageira dentro da
região da Avenida Paulista. Dessa vez, o delegado Rogério de Camargo Nader, do
78º Distrito Policial (DP), nos Jardins, pediu à Justiça a prisão preventiva de
Diego. A decisão, no entanto, deverá sair no domingo (3) durante audiência de
custódia, de acordo com o G1.
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