sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

A música brasileira e o direito à sensibilidade masculina

Descrição para cegos: imagem do cantor Gonzaguinha, durante um show.
Por Sara Gomes

Homem não chora”. Certamente você já deve ter ouvido esta expressão alguma vez na vida. Podemos dizer, a priori, que além de uma questão de gênero é uma atribuição cultural, difundida por gerações. Neste texto, refletiremos um pouco sobre como este conceito é largamente propagado na música brasileira.

Por algumas vezes, pude perceber que a reprodução deste discurso em diversos segmentos da música, fortalece na sociedade esta visão destoante entre os gêneros, em vez de combatê-la.O estigma de que o homem não pode chorar é apenas o carro-chefe dentre uma série de paradigmas impostos pelo modelo da sociedade patriarcal – o homem é o provedor da família constituinte, sinônimo de virilidade e etc.

Porém, as mulheres também são responsáveis pelo enraizamento destas convenções sociais quando educam seus filhos. Todo homem já escutou a frase, “Pare de chorar! Homem não chora!”, em diversas ocasiões da infância. Além disso, outra máxima que também valida à tradição patriarcal se dá ao associarem vaidade à idéia de “afeminado”, quando se trata do sexo masculino. Esta distinção equivocada acaba por moldar no homem, muitas vezes, uma identidade carregada de machismo e preconceitos.
Embora não seja novidade, me propus a fazer uma breve análise deste assunto, por enxergá-lo como um ponto preocupante e recorrente em nossa sociedade. Para ilustrar a presente reflexão, escolhi duas músicas brasileiras que abordam a temática.
A primeira música a ser analisada, é a canção “Homem não chora”, do cantor Pablo do Arrocha. Ela retrata a transfiguração da mulher submissa que prefere ignorar o respeito a si mesma, do que enxergar que a relação não é mais saudável. Por exemplo, na segunda estrofe, a música evidencia a superioridade masculina, quando fala que o homem “não pede perdão”.
A música de Frejat possui praticamente o mesmo título da citada anteriormente e procura aparentar a mesma superioridade masculina. Porém, na segunda estrofe, a frase “meu rosto vermelho e molhado, é só dos olhos pra fora”, o eu lírico masculino esconde seus sentimentos nos versos, talvez movido por um orgulho ferido, sendo contrária a sua expressão facial, logo, caracteriza a ironia. Mas há quem assuma o direito à sensibilidade masculina. É o caso do compositor e cantor Gonzaguinha em “Um Homem Também Chora”.
Através dessa música, podemos concluir o revesso da expressão abordada neste texto. Ao expor as fragilidades do homem, Gonzaguinha anula a possibilidade de que haja uma distinção de gêneros. Essa canção evidencia o amadurecimento de uma parcela da sociedade, ao contestar o discurso machista e propor uma nova compreensão do assunto, sem mais estabelecer diferenças entre os sexos. Mostra que o homem também tem a mesma capacidade de expressar seus sentimentos que a mulher, afinal de contas, os sentimentos transcendem esta divisão, por serem essencialmente humanos.   

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